No meio do distanciamento social, reparamos que as comunidades encontram novas formas de se unirem e se entreajudarem.
Vemos a preocupação com a idosa que vive sozinha e a quem os vizinhos levam as compras; as equipas de voluntários que trabalham com sem-abrigos encontram novas formas de distribuir comida, ensinar regras de higiene (e disponibilizar meios); as equipas de redução de danos continuam na rua a fazer troca de seringas, com comportamentos ajustados de forma a que os técnicos não corram riscos desnecessários.
As atitudes em relação à saúde também vão mudar. Lavar as mãos por 20 segundos, um hábito tão difícil de implementar, até mesmo nos hospitais, poderá ser um daqueles comportamentos a que já nos habituamos no decorrer desta pandemia, de tal forma que agora nem pensamos nele - quase como entrar no carro e colocar o cinto de segurança. Assim como deixarmos os sapatos da rua à entrada da casa - zona de sujos e zona de limpos. Pequenos gestos que foram incorporados no nosso dia a dia, mas que também são úteis para diminuir o risco de outras doenças infeciosas.
Também houve mudanças sociais quase impensáveis há cerca de um mês. O teletrabalho, as teleconferências, as aulas à distância - até mesmo para quem não tinha nenhuma prática disso. E é a primeira vez que ouvimos dizer: se estiver doente, fique em casa! Nós que estávamos habituados a ir trabalhar, nem que estivéssemos de rastos, convencidos de que estávamos a ter um comportamento dedicado. Percebemos agora que é um comportamento que pode colocar em risco os outros e que ficar em casa é a atitude certa perante uma doença infeciosa.
Percebemos também que estas estratégias não podem ser planeadas ao momento. Talvez aprendamos que a preparação para uma pandemia como esta inclua testes diagnósticos, vacinas, equipamento de proteção individual, camas, ventiladores..., mas também políticas de trabalho adaptadas e um sistema de saúde forte e estável. De repente, os profissionais de saúde são heróis - os profissionais nos centros de saúde, nos hospitais, mas também os de saúde pública que determinam as medidas de saúde pública no terreno. A todos foi exigido um esforço extraordinário, que não vacilou. É preciso construir e manter este exército treinado, atualizado e dedicado.
Apesar das contrariedades, algo positivo pode ser retirado da resposta que a sociedade conseguiu dar e dos novos comportamentos e perspetivas que adotou. Fazemos apenas dois apelos: seja resiliente e persistente nestas medidas, as coisas vão melhorar. E continue a praticá-las após o fim da pandemia.
Fonte: Jornal de Notícias ! Raquel Duarte, Pneumologista | Foto: Reinaldo Rodrigues/Global Imagens
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- 14 de abril de 2020